MESMO ÀS ESCURAS O POVO EXISTE

De previsão em previsão, o MPLA prevê que Angola atinja até 2027 (2025 foi a previsão anterior), uma capacidade instalada de 8.000 megawatts e uma taxa de electrificação de 50%, o que exigirá um investimento de 17,2 mil milhões de dólares (16,3 mil milhões de euros), disse hoje o Governo.

O objectivo de subida dos actuais 43% de cobertura para os 50% foi hoje anunciado pelo ministro da Energia e Águas de Angola, João Baptista Borges, na abertura da 7.ª edição da Africa Energy Market Place 2023, promovida pelo Banco Africano de Desenvolvimento (BAD).

João Baptista Borges começou por realçar que o continente africano ainda se debate com uma reduzida taxa de electrificação, e que Angola (independente há 48 anos e desde então nas mãos do MPLA) atingiu, nos últimos anos, um crescimento exponencial da sua capacidade instalada de produção de energia eléctrica, passando de 2.356,36 megawatts (MW), em 2015, para cerca de 6.319,43 megawatts actualmente, graças a “importantes investimentos”.

O governante do MPLA destacou a recente conclusão do Aproveitamento Hidroeléctrico de Laúca, que produz cerca de 2.070 MW, a ampliação do Aproveitamento de Cambambe, a construção da Central do Ciclo Combinado do Soyo, estando a decorrer a construção do Aproveitamento Hidroeléctrico de Caculo Cabaça, para a produção de cerca de 2.172 MW, que vai elevar a capacidade instalada do país, em 2027, para 9.644,09 MW, suplantando os 8.000 MW projectados.

Segundo o ministro, a par dos investimentos no domínio da energia hidroeléctrica, Angola iniciou o processo de reestruturação da sua matriz energética, tendo concluído, recentemente, as Centrais Fotovoltaicas do Biópio com cerca de 188 MWdc (MWfotovoltaico) e de Baía Farta, com cerca de 96 MWdc, que contribuem com cerca de 3,8%, no âmbito do Sistema Eléctrico Público.

Apesar dos investimentos, João Baptista Borges considerou que “os desafios ainda são imensos, face à necessidade de se garantir a expansão da rede de transporte de energia, para o sul e leste do país”.

“Pretendemos, no final de 2027, alcançar uma taxa de acesso de 50%, considerando uma população de 33 milhões de pessoas, o que pressupõe realizar cerca de 1.700.000 novas ligações domiciliares”, adiantou, apontando como estratégias para se alcançar a meta a expansão da rede eléctrica, o aumento da eficiência e sustentabilidade do sector e a aposta nas energias renováveis e participação dos privados.

Outro dos desafios, apontou João Baptista Borges, prende-se com o acesso ao crédito em condições concessionais, que permita ao país suportar o peso da dívida com a construção de novas infra-estruturas. “Aqui, o papel das instituições de crédito multilaterais, como o BAD e o Banco Mundial, é de relevante importância”, disse.

O governante angolano enfatizou a participação do BAD em projectos relevantes em Angola, como é o caso do financiamento para constituição da linha de transporte de energia eléctrica que vai interligar as províncias do Huambo, centro, e da Huíla, sul, assim eliminando o consumo de combustível utilizado para produção de energia nas cidades do Lubango e do Namibe.

De acordo com o ministro, o BAD está a apoiar o Governo na definição dos modelos de mini redes, prevendo-se a sua implantação em localidades a identificar no planalto central de Angola.

“Ressaltamos aqui a participação do BAD no financiamento da instalação de 1.300.000 contadores pré-pagos, que pretendemos implementar com a maior celeridade”, referiu João Baptista Borges.

O Governo pretende igualmente promover a construção de um sistema de transporte de energia eléctrica que ligue à vizinha República da Zâmbia e integre o Sistema Eléctrico Nacional, fazendo parte do sistema da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), estando em equacionamento o modelo de financiamento.

Apenas 43% dos angolanos têm actualmente acesso a electricidade, percentagem que fica abaixo dos 10% em três províncias do interior, referia um estudo divulgado em Julho de 2022. Relembre-se que, mesmo às escuras, Angola é independente há 48 anos, período em que sempre foi governada pelo mesmo partido, o MPLA.

O documento elaborado pela Associação Lusófona de Energias Renováveis (ALER) apresenta uma panorâmica sobre as energias renováveis em Angola, país que (de acordo com a crónica e ancestral propaganda do MPLA) pretendia atingir uma taxa de electrificação de 50% até 2025 (hoje esse objectivo já passou para 2027) e que prevê um crescimento na procura que deve chegar aos 7,2 gigawatts.

A situação actual caracteriza-se pelo baixo nível de electrificação já que pouco mais de 42% dos angolanos têm acesso a energia eléctrica, dos quais 37,8% através de ligação à rede eléctrica nacional. As províncias do interior do país têm os níveis mais baixos de taxa de acesso, como o Bié, o Cunene e a Lunda Norte, que rondam os 10%, enquanto em Luanda a taxa de acesso é de 66% e em Cabinda de 52%.

Em 2021, a capacidade total instalada de produção eléctrica era de 5,9 gigawatts, repartidos por 63% de hídrica e 37% térmica, num mercado dominado pela Prodel (Empresa Pública de Produção de Electricidade de Angola), onde existem 66 centrais, em que 63 são públicas, uma corresponde a uma parceria público-privada e duas são privadas.

Segundo o estudo apresentado na conferência internacional sobre energia renovável em Angola, organizada pela ALER em parceria com a Associação Angolana de Energias Renováveis (Asaer), o objectivo do Governo é que até 2025 pelo menos 7,5% da electricidade gerada no país provenha de fontes de energias renováveis, excluindo as grandes hídricas, com uma potência total de 800 megawatts prevista.

O petróleo e a biomassa são as principais fontes de energia primárias em Angola, com destaque para a preponderância da biomassa nos agregados familiares das áreas rurais, que representam 37% da população total.

Ainda assim, conforme apontou Isabel Cancela de Abreu, directora executiva da ALER, na comparação com outros países africanos, Angola é dos que menos recorre a este tipo de energia para cozinhar (essencialmente lenha).

O sector residencial representa a maior parte do consumo de energia, seguindo-se os transportes, enquanto o consumo industrial é ainda reduzido.

A mesma responsável elencou algumas dificuldades do sector como o elevado nível de perdas e as dificuldades da ENDE (Empresa Nacional de Distribuição de Energia) em fazer as cobranças, levando à acumulação de dívidas e colocando problemas de sustentabilidade financeira, resultantes da operação deficitária.

“Houve um aumento de tarifas, mas ainda não cobrem os custos”, indicou Isabel Cancela de Abreu, sugerindo a necessidade de alguns “aumentos não lineares”.

O relatório indica que Angola tem actualmente uma das tarifas de electricidade mais baixas da África subsaariana, defendendo aumentos progressivos “a bem da sustentabilidade do sector”, ainda que esta seja uma medida impopular, bem como o aumento da eficiência das empresas responsáveis pela produção, transporte e distribuição de electricidade, para que o custo real do quilowatt/hora seja reduzido.

“É importante desmistificar o conceito de que os consumidores não têm capacidade para pagar os reais custos do fornecimento de energia eléctrica”, refere o estudo, indicando que devem ser garantidos escalões de pagamento, de acordo com a vulnerabilidade dos consumidores. Faz sentido. Desde logo porque os 20 milhões de pobres não consomem energia eléctrica. Por regra “vivem” recorrendo à luz dos candeeiros… apagados ou, como explicou o emblemático general do MPLA, Bento Kangamba, à electricidade… potável.

Por outro lado, a insustentabilidade do sector eléctrico público “cria uma distorção de mercado que faz com que as soluções renováveis não pareçam ser tão competitivas como já são”, acrescenta o relatório.

Recorde-se que João Baptista Borges, ministro da Energia e Águas desde 2011, afirmou em 10 de Setembro de 2019, em Luanda, que era preciso aumentar a taxa de acesso à electricidade, num país onde só menos de metade dos cerca de 33 milhões de habitantes tem acesso a luz. Nesse dia, o Folha 8 considerou que esta afirmação não era uma questão de desfaçatez, considerando-a uma questão de criminosa incompetência.

João Baptista Borges discursava na abertura da palestra sobre o Financiamento dos Projectos de Energia Renováveis e o Ambiente Regulatório Óptimo para o Sector da Energia Eléctrica, promovido pelo Programa Power África, do Governo norte-americano, no âmbito da cooperação com Angola no domínio da energia eléctrica.

Segundo o ministro, havia uma significativa parte da população ainda a viver em áreas rurais ou semi-rurais, zonas das periferias das cidades, e era necessário encontrar-se soluções que sejam económicas para se levar energia eléctrica a essas localidades, eventualmente (quem sabe?) testando essa metodologia no Bairro dos Ministérios, no ginásio para os deputados ou até no Palácio Presidencial.

“O nosso país dispõe de recursos abundantes, recursos energéticos, primários como é o caso da energia solar”, que tem hoje um custo cada vez mais competitivo e é uma solução para a electrificação do país, admitiu o ministro. Depreende-se, perante tão sábia conclusão, que esses recursos abundantes só agora foram descobertos, pois o MPLA está no Governo há 48 anos.

O titular da pasta da Energia e Águas sublinhou que o Plano de Desenvolvimento do Sector Eléctrico e o Plano de Segurança Energética apontam para a construção de uma capacidade de cerca de 600 megawatts de energia solar no país até 2022, com a instalação de cerca de 30.000 sistemas individuais de produção de energias fotovoltaicas.

Folha 8 com Lusa

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